sexta-feira, 5 de março de 2010

Marília

Lá vai o distinto rapaz de camisa listrada, calça jeans manchada e sapatos velhos, caminha com passos curtos, contados e recalculados, até encontrar-se sobre os trilhos da velha ponte, e se jogar em meio a dor e as pedras reveladas pela seca.

O observador sabe que não precisa ser um conhecedor dos sentimentos, para descobrir que o jovem fora machucado, mas não ferido com uma faca, soco ou mesmo uma bala, mas sim por chagas feitas na alma.

Machucado pela dor que castiga seu bem querer fragilizado pela traição, traição está que o destino ao seu lado se torna réu, maldito destino que levou sua amada, maldito rapaz que conspirou com o destino.

Uma bela jovem de charme impecável e com boca de hortelã, semi-igual senhorita, em meio de milhares de belezas, sua maravilhosidade sempre fora a mais doce. Mas mesmo com tantos dotes ainda era a outra, a outra presa do rapaz que enganava a pobre com sua vã promessa de amor.

Nada como a dor da mulher amada, mas pior ainda é a a dor da mulher amada e traída, traída por saber das mentiras do amante, traída por saber que as juras somente eram verdadeiras na hora do gozo de amor. Uma pena que sua força não equiparava-se a sua beleza, então em meio ao banho de lágrimas foi criado um banho de sangue; uma bela jovem ferida profundamente por uma lamina afiada, estava morta com olhos abertos ainda em ressaca.

Quando o rapaz no apartamento chegou nada pode fazer, a não ser ler o bilhete jogado a centímetros da lívida mão da amante, que dizia: “eu sei de tudo, sei que nunca me amou, e que nunca será meu, e isso não posso suportar, adeus, com amor Marília”.

Sem um alvo a sua espera, fraco pelo golpe inesperado, triste e abalado, é fisgado pelo retórico da covardia, e também pelo egoísmo de sua ousadia de amar, mesmo sem ama-lá. Enquanto seu coração açoita sua razão, é impossível para ele sentir o cheiro da flor, afinal somente o calor da vingança esquenta seus pensamentos, estes que encontram-se vazios e sem cheiro de amor.